Representante da Ocupação Baronesa faz relato no CMDUA e COP

A representante da Ocupação Baronesa teve 5 minutos de fala na reunião do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental-CMDUA e 3 minutos na reunião do Conselho do Orçamento Participativo – COP, nas respectivas reuniões ocorridas em 04/06/2019. Relatou aos conselheiros que dez famílias ocuparam o prédio do município que estava abandonado havia dez anos. Apesar do estágio de degradação, os ocupantes tomaram o cuidado de conferir as condições de segurança dos compartimentos onde poderiam assentar as famílias. Isto se deu a partir de laudo técnico assinado por um profissional de arquitetura, que assegurou as condições para ocupação.

Desde que ocuparam, as dez famílias vêm trabalhando na recuperação das instalações anexas, do prédio e principalmente limpando o pátio arborizado que acumulou lixo ao longo dos dez anos. A população do entorno imediatamente aprovou, a vizinhança se sente mais segura, a rua está sendo revitalizada, sem o lixo acumulado que ameaçava a saúde da população com insetos (dengue), roedores e outros possíveis vetores de doenças. O convívio da ocupação com os vizinhos está propiciando vitalidade cultural, também, pois atividades desenvolvidas por apoiadores com as crianças são frequentadas pelos moradores do entorno, estreitando vínculos e criando laços de solidariedade mútua.

A representante da Ocupação citou, no entanto, que um procurador do município, no dia 08 maio, pressionou as famílias ameaçando-as de remoção sem qualquer ordem judicial. Desde então, as famílias vêm resistindo com a certeza de estarem fazendo cumprir a lei (função social da propriedade) além de terem encontrado de forma autônoma uma alternativa à vida nas ruas, sem abrigo, uma vez que as políticas habitacionais do município são inexistentes e as federais estão suspensas. Apesar de tudo isso, o poder público municipal conseguiu liminar para reintegração e o despejo das famílias foi agendado para sexta-feira, dia 07 de junho. A partir desse dia o prédio poderá voltar ao seu ciclo de degradação, de abandono, de foco de doenças como vinha ocorrendo ou será um espaço de vida, de alegria e solidariedade propiciado pelas dez famílias ocupantes. Defenda a Ocupação Baronesa do Gravataí para termos mais uma razão para construir uma cidade alegre!

Fórum de Gestão do Planejamento da Região 1 – RGP1

A obra que não termina: duplicação da Tronco engatinha em meio a disputa judicial para remoção das famílias

FONTE: SUL21

Trecho da duplicação ainda está longe de estar concluído | Fotos: Carol Ferraz/Sul21

Luís Eduardo Gomes 

Em 21 de junho de 2018, a Prefeitura de Porto Alegre anunciou que estava retomando as obras de duplicação da Av. Tronco. Iniciadas ainda em 2012, estavam previstas para a Copa do Mundo de 2014 e foram paralisadas em 2016, quando seus quatro trechos tinham apenas cerca de 30% executados. Quando da retomada das obras, a previsão de conclusão era em 2020. Quase um ano depois, avançaram, mas muita lentamente, e ainda permanecem negociações e disputas judiciais com famílias que moram em locais pelos quais o trajeto da avenida passa e precisam ser removidas. No final da tarde de segunda-feira (27), quando uma chuva caía na Capital, não se via sinal de pessoas trabalhando.

O aposentado José Raimundo Faschel Araújo, 78 anos, se instalou com a mulher e filha na região há 45 anos, quando ainda havia ranchos. Ele conta que foi uma das primeiras casas da rua. Lembra que havia apenas um comércio na esquina. O terreno era de propriedade privada, mas estava abandonado. Levou anos até que a questão fosse judicializada e, hoje, ele pede o usucapião da área. Araújo conta que a Prefeitura já o procurou em diversas oportunidades para tratar da utilização de parte dos fundos do terreno, onde deve passar um trecho da avenida e onde ele tem uma plantação, mas que não há negociações em aberto porque o processo de usucapião segue tramitando na Justiça.

Próximo à casa dele, na Rua Cruzeiro do Sul, há um imóvel de dois pisos que leva na fachada a marca do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), e deve ser removido. Apesar de solitária no trajeto que está com as obras em andamento, a família ainda não aceitou nenhuma proposta de negociação. Ao redor do imóvel, o que era para ser um canteiro de obras se converteu em um depósito de resíduos. A reportagem não conseguiu o contato dos moradores.

Casas foram marcadas para serem removidas pelo Demhab, mas algumas dezenas ainda permanecem de pé | Fotos: Carol Ferraz/Sul21

A avaliação de Araújo é que a retomada das obras “não mudou nada” na situação da comunidade. “Veio a Copa, foi a Copa e isso aqui está uma zona de guerra. Para sair de casa é um sacrifício. Eles trabalham um pouquinho ali, quando tu vê pararam, não fazem mais nada”, diz. A reclamação do aposentado é que não há um verdadeiro canal de diálogo aberto com  o poder público. “A Prefeitura não quer saber de diálogo. Não procura as famílias para dialogar. E o povo se acomoda, até que chega uma hora e eles dizem que tem que sair”.

A ideia original da Prefeitura ao incluir a obra no rol dos projetos de infraestrutura que contariam com recursos do governo federal em preparação para a Copa do Mundo de 2014 era duplicar a Tronco existente e fazer a interligação entre as avenidas Icaraí e Gaston Mazeron, envolvendo diversas vias da região conhecida como Grande Cruzeiro. Um trajeto de 6,2 km de extensão que funcionaria como uma alternativa de deslocamento na Zona Sul de Porto Alegre. Originalmente, a obra foi orçada em R$ 156 milhões e deveria incluir três pistas em cada sentido, corredor de ônibus, serviços de drenagem pluvial, iluminação, revestimento de passeios, plantio de árvores, sinalização horizontal e vertical e uma ciclovia.

Em resposta encaminhada à reportagem nesta quarta-feira (29), a Infraestrutura e Mobilidade Urbana (Smim) informa que os trechos 1 e 2 da nova Tronco estão com 35% de suas obras já executadas, mas ainda estão paralisados e com previsão de conclusão somente para julho de 2022, poucos meses antes da realização da segunda Copa do Mundo posterior ao mundial do Brasil. Segundo a pasta, essa etapa está aguardando a liberação de áreas para ser continuada nas proximidades da Av. Teresópolis. Já os trechos 3 e 4, retomados em junho de 2018, estão com 41% das obras executadas e conclusão prevista para julho de 2021.

Desde o início, um dos grandes entraves da obra foi a necessidade de remoção das 1.459 que moravam ou tinham comércio em imóveis pelos quais o novo trajeto deveria passar. A Prefeitura propôs algumas alternativas às famílias, um bônus-moradia no valor de R$ 52.340,00 — o que exige que elas achem uma casa à venda e a Prefeitura efetua a compra do imóvel com este valor –, o aluguel social de R$ 800 por mês ou um apartamento no Minha Casa, Minha Vida. Além disso, algumas famílias receberam indenizações pelas desapropriações. Inicialmente, 918 foram atendidas por essas opções.

O líder comunitário Lídio Santos, morador da Vila Maria, uma das comunidades que compõem a chamada Grande Cruzeiro, é um dos que permanecem no local. Ele diz que sua família começou a negociar com o governo municipal ainda em 2012, tendo optado pela alternativa do bônus-moradia. No entanto, conta que, na primeira rodada de negociações, não conseguiram achar nenhum imóvel pelo valor oferecido e a Prefeitura havia recusado a proposta que a família fez de juntar as indenizações de todos os seus membros para comprar um único terreno na Cruzeiro. “A gente nasceu aqui, morou aqui e queremos continuar aqui”, diz.

A ideia era facilitar o trânsito no Zona Sul, mas obras ainda são um transtorno para os moradores da região | Fotos: Carol Ferraz/Sul21

Com a retomada das obras, a Prefeitura atualizou os valores oferecidos para as famílias, com o bônus-moradia chegando a R$ 78.889,65, mas o aluguel social foi reduzido para R$ 500. Em janeiro deste ano, a Prefeitura anunciou que conseguiu junto à Caixa a liberação de R$ 31,3 milhões para a construção de três empreendimentos do Minha Casa, Minha Vida que devem ser destinados a reassentar famílias já removidas. Ao todo, serão 356 unidades e a previsão de entrega era num prazo de até 24 meses. “Até hoje não tem nenhum tijolo colocado. Só está criando mato e lixo”, diz Lídio.

Outras 195 famílias estavam em processo de negociação com a Prefeitura pelo bônus-moradia. De acordo com o governo municipal, ainda restam 20 famílias que permanecem morando no trajeto da duplicação. São famílias que não aceitaram as alternativas propostas pela Prefeitura e o caso delas foi parar na Justiça. O Demhab destaca, no entanto, que a proposta do bônus-moradia continua valendo caso as famílias encontrem uma nova residência em Porto Alegre — o acordo só vale para a Capital. Lídio diz que, em reunião realizada na Cruzeiro com representantes do Demhab no último dia 20, a comunidade foi informada de que 65 famílias ainda residem no trajeto da duplicação.

Araújo fala que a pressão sempre foi grande sobre as famílias para que aceitassem acordos, sendo que muitas acabaram cedendo por verem que o valor da oferta era alto, e só depois acabaram se dando conta de que não conseguiriam mudar para uma realidade melhor do que aquela que tinham na Cruzeiro. “A grande maioria das famílias está arrependida”, diz.

Lídio diz que um dos entraves atuais para os moradores aceitarem a negociação é justamente a experiência das famílias que já negociaram com o Executivo municipal no passado. “A Prefeitura mandava para cá lideranças comunitárias para convencer as pessoas e eles diziam que ‘dava para comprar uma casa na praia, comprar uma casa decente’. Iludiram as pessoas. Na época, nós criamos um grupo chamado chave por chave para que as famílias entregassem a chave da casa antiga só com a chave da nova, mas a Prefeitura combateu fortemente o movimento e não tivemos muito apoio. As pessoas entregaram a casa e foram saindo. Tem uma família que entregou a casa, foi morar em Cidreira, mas não conseguiu emprego. Retornaram para a Cruzeiro e estão morando de aluguel. Eles tinham uma casa”, diz Lídio.

Lixo toma conta de um dos trechos que deveriam fazer parte da duplicação da Av. Tronco | Fotos: Carol Ferraz/Sul21

Outro agravante é o fato de que o aluguel social, uma das alternativas oferecidas, apresenta atrasos frequentes nos repasses pela Prefeitura. Além disso, os empreendimentos do MCMV jamais saíram do papel. Lídio é cético quanto à possibilidade deles chegarem a ser construídos um dia. “O Minha Casa, Minha Vida já estava congelado no governo Temer e agora parece que o Bolsonaro está acabando com o programa. Como eles vão fazer esse empreendimento?”, questiona.

Em janeiro deste ano, ele voltou a fazer a proposta para o Demhab de juntar os bônus-moradia, já atualizados para R$ 78 mil, de todos os membros da família, o que foi aceito. Contudo, a família ainda não conseguiu achar um terreno que comporte todo mundo. “Não é fácil. Mesmo juntando tudo, o que dá uns R$ 300 mil, a gente não está achando uma casa na Cruzeiro. O valor aqui é de R$ 500 mil para cima”, diz.

A família, composta por ele, a mãe e quatro irmãos, mora em um terreno comprado pela matriarca na Rua Silva Paes em 1988. Nesta semana, ele recebeu a intimação de um oficial de justiça de uma decisão de reintegração de posse. A Prefeitura alega que trata-se de uma área pública que foi invadida mais recentemente, mas o líder comunitário diz que há documentos de que trata-se de uma casa de religião de matriz africana que está no local desde o final dos anos 1990. “Temos o recibo de compra e venda”, diz.

Lídio diz que a Prefeitura está fazendo uma grande pressão sobre os moradores que ainda permanecem no local. “Eles estão tocando o horror nas pessoas, fazendo um filme de terror. Na realidade, eles querem retirar as famílias até o final do ano. Se não achar uma casa logo, estão ameaçando entrar com reintegração de posse”. Segundo ele, o que as famílias precisam é de tempo para encontrar um imóvel adequado. Lídio diz que o que os moradores remanescentes pedem é tempo. “Assim como estamos esperando desde 2011 a questão da obra e faltava dinheiro, que eles também nos deem tempo hábil para achar uma casa. Não é assim, da noite pro dia, arranjar uma casa”, diz.

Araújo foi um dos coordenadores da União de Vilas da Grande Cruzeiro, entidade criada nos anos 1970, mas que perdeu força posteriormente. Ele conta que os movimentos populares na região voltaram a se fortalecer em razão da remoção das famílias. Foram organizadas passeatas e lideranças comunitárias procuravam as famílias para esclarecê-las sobre os direitos que tinham. Contudo, ele diz que, à medida que a maioria dos moradores foi aceitando o acordo proposto pela Prefeitura, o movimento se desarticulou. “Mesmo os moradores que ainda não saíram não conseguem se articular, não aparecem em reuniões de associações”, diz.

A NOSSA ÚNICA SAÍDA É A LUTA! – Por MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas

Fonte: Página da  Ocupação Lanceiros Negros Vivem MLB – RS

lanceiros

Hoje foi um dia histórico para nós e para nossa cidade. Não por conta do Judiciário, nem por conta da Brigada Militar, mas pelo fruto de nossa luta!

Desde às 23h de ontem, fomos cercados pela Brigada Militar, que impediu que moradores entrassem na Ocupação. Logo passamos a organizar nossa resistência, a chamar apoiadores e apoiadoras. Passamos a noite tensos, preocupados, na incerteza do que poderia ocorrer na próxima manhã, lembrando do massacre que foi a última reintegração que passamos.

Nesta reintegração, que ocorreu dia 14 de junho deste ano, várias violações foram cometidas. Várias inconstitucionalidades foram cometidas. As bombas de gás lacrimogéneo, spray de pimenta e tiros que foram lançados contra adolescentes e idosos naquela data, não foram jogadas nesta, demonstrando o reconhecimento da própria Brigada Militar do quão absurda e desproporcional foi a força utilizada contra famílias de trabalhadores que lutam por uma moradia digna.

Apesar de não ter sido usada, sabemos que em outras ocupações, a realidade não é a mesma. Também sabemos que nestas reintegrações de posse, que são verdadeiras operações de guerra, são gastos milhões de reais que poderiam ser revertidos em programas habitacionais.

O que vimos hoje foi um verdadeiro circo, que durou quase 24h, mobilizou centenas de brigadianos e fez do centro uma verdadeira trincheira. Tudo isto para fazer algo que sempre foi exigido pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas: diálogo. Diálogo efetivo, no qual fossem propostas alternativas de abrigo e habitação para as famílias.

Hoje, após 1 ano e 7 meses ocupando um prédio público e 1 mês e meio no Hotel Açores, tivemos a primeira abertura oficial de negociação de unidades habitacionais. Esta é uma vitória que demonstra que somente a luta pode mudar a nossa realidade. Somente o povo organizado é capaz de decidir seu futuro! Fizemos uma resistência heróica no centro da cidade, o que obrigou o poder público a negociar! Negociar aquilo que sempre nos foi negado. Aquilo pelo qual lutamos e entregamos nossas vidas: moradia digna.

Sabemos que as promessas que hoje foram feitas estão em um papel. Para que saiam do papel, seguiremos nosso processo de luta! Esse foi um pequeno passo em nossa trajetória, mas hoje estamos mais próximos de nossos objetivos do que ontem!
Apesar de nossa felicidade, ficam alguns questionamentos: o que ocorrerá com o Hotel Açores? Ele ficará fechado assim como o prédio estadual da esquina da General Câmara com a Andrade Neves?

E as demais reintegrações de posse? Serão truculentas?
Neste cenário, temos certeza que os únicos interessados em acabar com a desigualdade espacial de nossa cidade, interessados em construir uma Porto Alegre mais humana e mais justa somos nós, movimentos sociais, que lutam incessantemente pelos direitos de todos que aqui nasceram e cresceram.

Seguiremos atentos, para que ocupação não seja caso de polícia. Seguiremos denunciando a escolha ideológica dos governantes que optam por gastar mais com policiais do que com a efetivação de direitos constitucionais. Seguiremos lutando, até alcançarmos a vitória!

MLB, ESSA LUTA É PRA VALER!
COM LUTA, COM GARRA, A CASA SAI NA MARRA!
AQUI ESTÁ O POVO SEM MEDO, SEM MEDO DE LUTAR!
#ResisteLanceiros

Na zona sul de Porto Alegre, 57 famílias lutam contra ameaça de despejo

Fonte: RS Urgente

Área que pertencia ao Montepio dos Funcionários Municipais foi a leilão em dezembro de 2016 e acabou sendo arrematada pelo Sindicato dos Guardadores de Automóveis de Porto Alegre. (Foto: Associação Loteamento Romeu Samarani Ferreira/Facebook)

Cerca de 300 pessoas que vivem no Loteamento Romeu Samarani Ferreira, localizado na bairro Campo Novo, na zona sul de Porto Alegre, entraram na lista das ameaças de despejo na capital gaúcha. As 57 famílias que vivem na área sofreram um início de ação de reintegração de posse no dia 24 de novembro, que acabou sendo suspensa por uma liminar. Agora, uma nova ação de reintegração está prestes a acontecer. A área, que pertencia ao Montepio dos Funcionários Municipais de Porto Alegre foi a leilão em dezembro de 2016 e acabou sendo arrematada pelo Sindicato dos Guardadores de Automóveis de Porto Alegre, em parceria com um profissional da área de contabilidade do interior do Estado por pouco mais de R$ 2 milhões. A reintegração está sendo solicitada pela massa falida do Montepio.

Segundo Marcelo Dias, presidente da Associação de Moradores Loteamento Romeu Samarani Ferreira, a comunidade vem lutando para tentar uma reunião de conciliação na Justiça. “Nós queremos negociar as casas. Já fizemos um depósito judicial para demonstrar nosso interesse e estamos juntando dinheiro para uma provável negociação. Mas é incrível como as coisas estão acontecendo. Nós podemos sofrer uma reintegração de posse a qualquer momento, após um leilão realizado em dezembro, onde quem adquiriu a área foi o Sindicato dos Guardadores de Automóveis por R$ 2,070 milhões, quando o valor de mercado desta área é estimado em aproximadamente R$ 8 milhões”.

Marcelo Dias relata que uma comitiva de moradores foi ao Ministério do Trabalho e que o referido sindicato não teria sequer registro legal hoje junto ao ministério. “Também nos informaram que estão inativos na Receita desde 2013. Mesmo assim eles foram aceitos no processo de leilão”, afirma. A comunidade, acrescenta o presidente da associação, está com um sentimento de angústia. “O pior é a gente saber que, se a situação não se resolve, não é porque não quisemos negociar. Não estamos tendo nem a oportunidade de negociar e debater a situação, que é a mais viável. Os caras recebem e a gente fica nas nossas casas. Estamos aqui desde 2004 e nunca tivemos essa oportunidade. Entre as pessoas principais citadas no processo, uma já está morta e a outra nem mora mais aqui”.

Ele cita os dados da última contagem do quadro social da associação: são 300 pessoas no total, somos 57 famílias, 23 crianças frequentando escolas municipais e estaduais aqui em volta, 3 crianças com necessidades especiais, 12 crianças frequentando creches municipais, 30 idosos, sendo 16 deles com doenças crônicas que necessitam de cuidados especiais de saúde, um deficiente visual e um deficiente mental.

Marcelo assinala ainda que o processo de reintegração de posse abrange uma área muito maior que a do loteamento Romeu Samarani Ferreira, envolvendo mais de 500 famílias que vivem em um bairro já consolidado. “É uma área consolidada gigante, com mais de 2.500 moradores, onde, segundo dizem, neste primeiro momento não haverá reintegração. Só a da nossa área. A maioria das pessoas que mora no nosso loteamento comprou essas casas. Existe muitos funcionários públicos municipais. Temos vários casos de pessoas que compraram a casa na imobiliária, com toda a documentação solicitada”.

Pedido de investigação no MP de Contas

No dia 7 de abril deste ano, a vereadora Sofia Cavedon (PT) encaminhou uma representação ao Procurador Geral do Ministério Público de Contas, Geraldo Costa da Camino, solicitando uma investigação sobre o processo de leilões envolvendo áreas pertencentes ao Montepio dos Funcionários Municipais de Porto Alegre, algumas delas bem conhecidas como a que abriga hoje o Nova Olaria, na Cidade Baixa. Esse processo, destacou a vereadora na ocasião, é de interesse público, na medida em que a massa falida é devedora da Previmpa e do próprio município de Porto Alegre. Em algumas destas áreas, assinalou ainda Cavedon, o município lançou projetos habitacionais de interesse social e criou Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), sem possuir, porém, a titularidade das mesmas.

Na representação, Sofia Cavedon também pediu uma investigação sobre o processo envolvendo a área do loteamento Romeu Samarani Ferreira, que teve como adquirente o Sindicato dos Guardadores de Automóveis de Porto Alegre, entidade que, na avaliação da vereadora, “não possui corte econômico a participar de hasta pública dessa monta”. Ela questionou ainda o documento de “parceria empresarial” apresentado pelo referido sindicato com um profissional da área de contabilidade por ocasião do leilão de dezembro de 2016. Sofia Cavedon solicitou uma avaliação da “legalidade dos procedimentos adotados pelo município, pela massa insolvente e demais interessados nos feitos à massa relacionados”.

Sul21 tentou entrar em contato com o Sindicato dos Guardadores de Automóveis de Porto Alegre pelos telefones disponibilizados pela entidade na internet e em uma página no Facebook, mas não obteve êxito. Um dos números remeteu a uma empresa de crédito consignado e outro foi informado como não existente.

(*) Publicado originalmente no Sul21.

Projeto de Lei (PLCL 026/16) em tramitação na Câmara de Vereadores de Porto Alegre não resolve problemas de Habitação de Interesse Social

Lucimar F. Siqueira – Observatório das Metrópoles Núcleo Porto Alegre ; Coletivo A Cidade Que Queremos

Mário L. Lahorgue – Observatório das Metrópoles Núcleo Porto Alegre; Depto. Geografia – UFRGS

Tramita na Câmara Municipal de Porto Alegre o Projeto de Lei Complementar 026/16 que propõe modificar o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental – PDDUA (Lei Complementar nº 434, de 1º de dezembro de 1999) para viabilizar a implantação de um loteamento social (para faixa de renda até 6 Salários Mínimos-SM) na zona sul de Porto Alegre.

O referido projeto nos chama atenção por vários aspectos. O primeiro deles é que, logo na “Exposição de Motivos”, o autor do PLCL deixa claro que trata-se de uma ação para atender ao objetivo de uma “empresa urbanizadora”. O autor demonstra, também, ter se acercado de informações sobre o mercado de terras para a faixa de renda até 6 SM, atitude esperada de quem está preocupado com a comercialização dos terrenos. No entanto, o fundamento da sua justificativa, que é o atendimento da Demanda Habitacional Prioritária (DHP), não se sustenta, pois não há contextualização do PLCL ao conjunto de discussões e leis que tratam da Habitação de Interesse Social, onde se insere DHP, menos ainda com o setor da Prefeitura responsável pela questão da moradia. Começa pelo fato do autor sequer ter citado o Plano Local de Habitação de Interesse Social – PLHIS.

O PLHIS é o documento orientador da política habitacional das cidades brasileiras. Foi instituído a partir da Lei 11.124/05, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social. Todos os municípios que se credenciaram ao Programa Minha Casa Minha Vida, por exemplo, elaboraram seu PLHIS. O documento é constituído por três partes: Metodologia, Diagnóstico e Metas. Consta no PLHIS de Porto Alegre a indicação de que os loteamentos para Demanda Habitacional Prioritária (DHP) deverão estar vinculados a programas oficiais municipal, estadual ou federal (1). Portanto, não se destina à autoconstrução, como justifica o autor do PLCL.

Outro aspecto que consideramos importante é que o autor do PLCL 026/16 deixou de mostrar conhecimento sobre as recentes avaliações realizadas sobre o maior programa de Habitação de Interesse Social do país, o Programa Minha Casa Minha Vida. O fato do projeto em questão na Câmara de Porto Alegre não estar vinculado ao Programa Minha Casa Minha Vida, não deve ser razão para ignorar as avaliações referentes ao programa, pois o “loteamento social” e habitações sociais se inserem nesse contexto.

Um dos aspectos mais criticados nas avaliações do Programa Minha Casa Minha Vida, foi o fato das habitações serem construídas distantes da cidade consolidada, em áreas periféricas e muitas vezes afastadas dos locais de origem dos moradores. Ora, o PLCL 026/16 contraria tão fortemente os critérios de implantação de moradia social bem localizada que chega ao ponto de pressionar a zona rural de Porto Alegre!

De acordo com o documento elaborado pelo Ministério das Cidades “Como produzir moradia bem localizada com os recursos do Programa Minha Casa Minha Vida? Implementando os instrumentos do Estatuto da Cidade”, a localização da Habitação de Interesse Social deve levar em conta a “política urbana, habitacional e fundiária com programas voltados à regularização fundiária e à ocupação de áreas centrais e vazios urbanos” (o documento é de fácil acesso e pode ser encontrado no site do Ministério Público – RS, entre outros endereços na internet). A afirmação anterior reforça que o PLCL está completamente fora das orientações técnicas vigentes no país.

Ainda, o Próprio Plano Diretor de Porto Alegre, em seu Art. 76, § 2º, diz que “a delimitação de áreas destinadas à habitação de Interesse Social em Porto Alegre dar-se-á pela instituição de Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS III) pelo Poder Executivo, considerando o déficit anual de demanda habitacional prioritária e os imóveis subutilizados das AUOPs (Áreas Urbanas de Ocupação Prioritárias)”. Ora, a área em questão no PLC não é uma Área de Ocupação Prioritária, sob nenhum critério. Área de Ocupação Prioritária, lugar adequado para implementação de Programas de Habitação de Interesse Social, conforme o Art. 79 do Plano Diretor, “são os locais da Área de Ocupação Intensiva identificados como imóveis urbanos destinados à ocupação prioritária, visando à adequação de seu aproveitamento e ao cumprimento da função social da propriedade”. Mesmo que transforme em Área de Ocupação Intensiva, não será uma Área de Ocupação Prioritária, portanto, não atenderá a Habitação de Interesse Social de forma adequada.

As áreas das cidades destinadas para HIS, ou seja, para população com renda até 6 Salários Mínimos, chamam-se Áreas Especiais de Interesse Social – AEIS. Podem ser áreas livres para construção de moradias ou áreas ocupadas por população de baixa renda e que aguardam a regularização ou urbanização. Em levantamentos realizados até novembro de 2016 em Porto Alegre (2) , a equipe do Observatório das Metrópoles – Porto Alegre identificou 324 AEIS. Destas, 52 são áreas não ocupadas que aguardam a implementação de projetos para produção de moradia. Estão entre elas, por exemplo, as áreas localizadas na Vila Cruzeiro, bem localizadas, totalmente integradas à cidade e que deveriam ser usadas para reassentamento de moradores atingidos pelas obras de duplicação da Av. Tronco. Não foram utilizadas para este fim, tanto que mais de 50% dos atingidos já receberam Bônus Moradia e foram afastados da possibilidade de retornar para estes locais quando o projeto habitacional for implementado. Portanto, caso o autor tenha interesse na questão da moradia, sugere-se o diálogo com o departamento que trata da habitação em Porto Alegre – o DEMHAB –, que discuta com o Conselho Municipal de Acesso à Terra e Habitação – COMATHAB e, como alternativas de áreas, que proponha a urbanização das AEIS já existentes ou a produção habitacional nas AEIS da Vila Cruzeiro, por exemplo.

Desta forma, considerando as observações anteriores, entendemos que, se o PLCL 026/16 for aprovado, poderá aprofundar os problemas sociais envolvidos com a questão da moradia, pois condiciona à extrema periferização de população de baixa renda. Na forma como está, não promoverá a Habitação de Interesse Social, pois como claramente indica o Plano Diretor de Porto Alegre no Art. 23, deve-se levar em consideração a ocupação e uso do solo urbano bem localizado e a posição relativa aos locais estruturados da cidade, em especial o acesso ao trabalho e aos serviços essenciais.

(1) “Regula a aprovação de loteamentos, pelo Poder Público Municipal, nos padrões que estabelece, exclusivamente em empreendimentos destinados à produção habitacional que atenda à Demanda Habitacional Prioritária (DHP), vinculados a programas oficiais desenvolvidos pelo Poder Público Municipal, Estadual e Federal.” Plano Local de Habitação de Interesse Social. DEMHAB, Porto Alegre-RS, 2009.

(2) Foram consideradas as AEIS do PLCE 005/16, que atualizou as áreas destinadas ao PMCMV. Neste PLCE foram superadas as restrições ambientais existentes no projeto anterior (áreas não comprometidas pela incidência de Restrições Ambientais).